99,9% das pessoas vivas são depressivas. Mas se tu não aguentas a pressão e queres mesmo matar-te, pelo menos faz isso bem feito:
Para morrer basta estar vivo, já dizia um velho ditado popular. Apesar da imensurável sabedoria contida nesse ditado, a maioria das pessoas não consegue lidar muito bem com a morte, à qual Neil Gaiman já se referiu como o grande momento da vida. Quando friamente analisada, a morte acabará revelando-se como um evento de igual magnitude, significado e força de um nascimento, apenas ao contrário. A grande diferença é que na morte não acabamos enfiando-nos sufocadamente cona adentro. Menos mal: não seria um final muito agradável de qualquer maneira.
Apesar de ser tratada com mistério e distância por quase todos os habitantes do planeta, a morte está sempre na nossa boca e pronta para aparecer sem aviso, para nos enganar sem remorso. Enquanto a esmagadora maioria prefere colocar isso tudo de lado e seguir a vida, existem aqueles “control freaks” que simplesmente não admitem deixar as suas vidas ao sabor do acaso e planeiam cada pequena etapa de sua existência, incluindo as suas próprias mortes. E, existem também os que são perseguidos incessantemente pelos seus demónios, fantasmas e demais assombrações e que não aguentam mais o peso de ser e estar aqui e agora.
Para as esquisitas criaturas citadas e todos os demais mortais, adultos, velhos ou adolescentes suicidas góticos e não góticos do meu Portugal aqui vai o Guia do Suicida:
Tomando a decisão:
Ao contrário do que se pensa, não se toma a decisão de acabar com a vida assim, de uma hora para outra: é um trabalho de semanas, talvez até mesmo meses. Anos não porque aí já se transforma em fiasco e toda a gente aprende a não ligar mais quando tu enches o estômago de comprimidos com alcool ou tens comportamentos realmente suicidas. A única coisa realmente importante sobre essa decisão é o facto de ela ter de ser definitiva. Se te resolveste matar, então mata-te. Não fiques enrolando as ideias. Isso cria uma expectativa imensa nas pessoas que te cercam e não é fixe ficar frustrando as festas dos teus inimigos, arruinando o fim-de-semana do coveiro e pondo por água abaixo os planos da tua mãe de alugar o teu quarto para aquele portentoso, exótico e sensual estudante africano ou imigrante Ucraniano.
Eu é que não vou me meter nas tuas decisões. Não importa como e quando tu te resolveste matar: o problema é teu. E é mesmo. O problema é teu e ninguém tem nada a ver com isso. Envolver mais uma pessoa na decisão só é válido se tu estiveres com muita vontade de causar um clima de tragédia grega. Estilo mergulhar de cabeça do décimo andar de um prédio no carro do teu pai porque ele não te citou no testamento ou estourar os miolos na frente de uma plateia de 300 pessoas enquanto fazes, contra a vontade, um importante discurso aceitando um prémio no auditório da escola. De qualquer forma, isto não é muito recomendado, porque se tu sobreviveres em qualquer uma das situações, tudo não vai passar de uma gaffe fodida.
Escolher o método:
Segundo consta, existem perto de seis milhões de maneiras de morrer, mas a maioria delas exige a presença de vírus raríssimos, disfunções corporais lentíssimas ou muita, mas muita falta de sorte. Apressar a hora da morte é um tanto complexo, mas com um pouco de pesquisa tu chegas a um grupo de 16 métodos comprovadamente eficazes de suicídio para escolher. Vamos a eles:
Forca - Sempre nas cabeças do top ten do suicídio nas prisões, o enforcamento também é bastante popular entre artistas europeus angustiados (não só os que nasceram por cá, mas também os que por qualquer razão habitam o novo mundo). O principal problema da forca no século XXI é arranjar algum lugar para pendurá-la. Num mundo dominado por uma arquitectura urbana e “clean”, rareiam as vigas e barras suspensas. Isto sem falar na escassez de árvores de ramos grossos e no grande equívoco que é tentar enforcar-se no chuveiro. Em 90% dos casos, o chuveiro vem abaixo e tudo que sobra para o suicida são escoriações, hematomas e uma tremenda e fodida porcaria para limpar na casa de banho.
Veneno - Muito em voga nos romances românticos, o veneno vem caindo de popularidade por ter se tornado bastante ineficaz no homem contemporâneo. Assim como o hábito de consumir pequenas doses de cicuta livrou Sócrates da morte, a nossa mania de ingerir glutamato monossódico, inspirar insecticidas variados e outras merdas químicas praticamente nos imunizou frente a qualquer veneno disponível no mercado. O máximo que uma tentativa de suicídio venenosa pode trazer ao suicida é uma caganeira ácida persistente durante algumas semanas, o que pode lhe render alguma merda no recto que vá incomodar pelo menos durante o período em que terá de ficar pendurado de bruços no hospital, levando água quente no cagueiro.
Tiro na cabeça - É o must do momento e um dos meus preferidos. Sem dúvida a melhor maneira. Se tu queres mesmo matar-te, a melhor e mais rápida saída é meter uma bala na cabeça. Não tem erro. Quer dizer, não tem muito erro. O segredo aqui é escolher bem o calibre. A grosso modo, dá para se usar a regra do quanto maior, melhor, apesar de uma bala 22 causar um estrago realmente impressionante se conseguir penetrar a caixa craniana através do céu-da-boca ou coisa assim. Na maioria das vezes, contudo, não penetra e aí é que está feita a merda. A pior coisa que pode acontecer ao tentares matar-te com uma arma de fogo é tu errares milimetricamente o ângulo do tiro e atingir apenas uma área não-vital do cérebro, como o movimento dos membros, por exemplo. Dessa forma tu estarias muito pior do que morto: entrevado numa cama sem poder fazer nada, nem mesmo tentar novamente matares-te.
Por via das dúvidas utiliza uma 44 ou uma espingarda, e dispara para dentro da boca, é infalível.
Afogamento - Pouquíssimas pessoas escolhem o afogamento como método de suicídio, principalmente porque vivem muito longe do litoral, barragens, rios, lagos ou qualquer outra fonte de água. A água é um dos maiores assassinos da natureza e é capaz de provocar uma morte bastante teatral, mas não é nada fácil morrer afogado de livre e espontânea vontade. Se tu decidires encerrar o sofrimento na água, lembra-te e de usar muita lã e encher os sapatos e qualquer bolso disponível de quantidades absurdas de pesos antes de pular na água. Uma vez que comeces a afundar, dá uma larga e entusiasmada golfada e não gastes energia tentando nadar para a superfície. Dá um olá para toda a sorte de criaturas esquisitas que de qualquer forma vão-te devorar mais tarde e aproveite a imensidão azul enquanto vais descendo rumo ao fundo.
Beber até morrer - A saída dos cobardes. Todo a gente sabe que, apesar da música do Ratos de Porão, beber até morrer é impossível. Primeiro porque se tu escolheres justamente este método, é porque tu já bebes e se tu já bebes, não existe como morrer disso em apenas uma noite. Para estes casos, aplica-se o mesmo algoritmo do veneno. A pior parte deste método é o dia seguinte. Apesar de desejar estar morto, tu estarás vivo e terás de conviver com a impiedosa ressaca e a apavorante caganeira líquida que precede qualquer bebedeira decente. E, claro, provavelmente terás esquecido porque bebeste tanto para começar.
Cortar os pulsos - Um tanto poética demais, a morte pelos pulsos sempre foi popular por permitir, até um certo ponto, o arrependimento do suicida. Quem opta por cortar os pulsos muitas vezes está apenas tentando dar um gigantesco cagaço em alguém e, convenhamos, existem diversas maneiras de se fazer isso sem precisar envolver sangue, navalhas e a possibilidade de um erro de julgamento transformar tudo em morte real.. Por outro lado, morrer pelos pulsos pode ser uma experiência bastante relaxante. Não raramente é feito o uso de uma banheira de água quente para aquecer o corpo que vai arrefecendo com a perda de sangue para tornar a morte menos traumática, creio. Mas na maior parte dos casos o que acontece é refogar-te em molho pardo.
Medicamentos - É consenso, quem toma remédios para se matar é porque não quer se matar, só quer chamar a atenção. A não ser que tu mores sozinho e não recebas visitas há mais de ano, esse é o mais estúpido dos métodos de suicídio. As chances de que alguém te encontre atirado num canto com uma caixa de tranquilizantes e te leve para fazer uma constrangedora e dolorosa lavagem intestinal são imensamente grandes. E pior: algumas horas depois da experiência inesquecível, enquanto tu ainda recuperas meio zonzo no teu quarto de hospital, aquela enfermeira boazona que consideraria a hipótese de te fornecer o belo traseiro soltará risinhos de escárnio enquanto pensa: mas que fracasso.
quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011
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