
Uma das características notáveis da principal obra de Martin Hidegger, Ser e Tempo (1927), é o facto de, apesar da sua preferência por temas religiosos, a palavra «Deus» nunca ser usada. Isso acontece porque no relato fenomenológico do Ser a referência a Deus não é necessária. A forma como existimos, Dasein (literalmente «ser-aí), é definida, pelo modo como este ser encara a morte, podendo fazê-lo autêntica ou inautênticamente. Este último modo ocorre quando reconhecemos a ubiquidade da morte como algo que afecta os outros, o que é muito diferente de enfrentarmos a nossa própria morte. A minha morte representa o fim das minhas possibilidades, o completo colapso e o fim do meu mundo. A nossa morte é diferente da morte dos outros. O acto de morrer pertence á pessoa que está a morrer, e aqueles que permanecem vivos não podem experienciar a perda de ser que acontece a essa pessoa. Só podemos estar junto do outro, mas não podemos ser o outro. Assim, de certa forma, todas as pessoas morrem sozinhas.
Mas, ao mesmo tempo, a perda de ser que advém da morte de outra pessoa pertence-nos, já que esta não a pode experienciar completamente, dada a brevidade do período de tempo entre o seu estado vivo e o seu estado morto. A noção de se estar morto (aqui no sentido de ser morto), é absurda, já que sugere que existe um ser no próprio estado de estar morto, o que é absurdo.
Esta tentativa de confrontar a morte considerando a nossa própria morte em vez de considerar a morte de outros é tão difícil que conduz a um nível de ansiedade que culmina com o fim do próprio Dasein. Torna-se então necessário cultivar um sentimento de Angst que permita ao Dasein defrontar a morte, primeiro afastando-a e depois confrontando-a. A morte deve ser vista como mais do que um evento que acontece por acaso (a atitude inautêntica): a existência autêntica ocorre quando compreendemos a natureza da nossa finitude, a nossa finitude essencial.
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